NUANCES DE UMA TARDE - jonilson montalvão

Num dia de calor que não deveria. Lavo a louça como brincando com água e realmente brinco. A xingu num canto da pia sendo apreciada aos poucos. João Bosco dando o tom do início da tarde e minhas plantas recebendo a luz solar pela entrada da janela. Tudo num dia calmo e não diferente de tudo mas, assim mesmo, se distanciando das coisas que são cotidianas. O fogão esperando uma água com sabão já há algum tempo; hoje ele não escapa, penso e corro pro copo apreciando a espuma escura que se fez. A delícia da vida é um pormenor irreparável. Pois a vida não é, ela se faz e a gente a faz tal qual uma linha que segue sem direção para qualquer lugar; e um lugar indefinido é já um parâmetro que pensamos em outro instante. Sem dizer muito e sem pensar muito trilhamos incondicionalmente para as derivas da razão. Dinamizar as relações e permear com novos sabores os mais novos amigos. Um olhar pela janela do apartamento é um descobrir de mundos tão distantes e tão próximos. Tudo que nos diz basta para realçarmos a memória e seguirmos em qualquer caminho; rastrear a sabedoria popular é a vida. Um sutil olhar e um outro universo se abre diante dos nossos preconceitos e a vontade de fotografar tudo e imensurável. Mas contenho o ímpeto imediato e aproveito para balançar numa rede improvisada num canto da sala. O menor é louvado sem ranços e sem cortes passados da memória que imperscrutável segue num ritmo alucinante por viés turvos. A música faz a trilha da tarde sem romper com outros aspectos da preguiça e é tão bom isso que deixo-me cair sem muito esforço e continuo apreciando o vento que atravessa os prédios e me chega sem cobrança e sem perguntas. A cidade está lá e a névoa que não é natural a encobre sem sutilezas, mas olhando bem, e mais uma olhada, consigo, ainda, ver uma certa beleza nesses concretos, ou como disse um amigo “paisagem morta”, rio disso agora que deixei as interpretações fora do jogo. É tudo nuance mesmo, desde projeções até divagações. Tudo não passa de nuances.

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